Patadas y Gambetas

Sampaoli humilha policial, e parte da Argentina pede sua demissão

Tales Torraga

''Idiota, você ganha cem pesos por mês, estúpido!''

Foi assim, com esta frase nojenta, que o treinador Jorge Sampaoli, da seleção argentina, precisou ser contido por amigos para não agredir um policial na madrugada deste domingo (24). O entrevero ocorreu na saída do casamento de sua filha, Sabrina, em Casilda, sua cidade-natal. O vídeo do descontrole está aqui.

Sampaoli estava em um Ford Focus com outras sete pessoas, quando um policial parou o veículo que estava sendo conduzido por sua mulher. Ela fez o teste do bafômetro – que deu negativo – e, antes de seguir viagem, o policial pediu para que todos descessem do carro porque no veículo havia mais gente que o permitido.

Sampaoli é contido – Reprodução

Foi aí que o técnico explodiu, e a discussão caiu terrivelmente na Argentina.

Humilhar qualquer um por dinheiro é péssimo em qualquer lugar. Mas em uma Argentina sempre contando os pesos para fechar o mês, o gesto é ainda pior.

Foram muitos, por exemplo, os que comemoraram há um mês a lesão do atacante Darío Benedetto, do Boca Juniors, em jogo contra o Racing. Benedetto passou o jogo desprezando os zagueiros dizendo a eles que ''com o dinheiro que tinha, poderia contratar todos para jogar no quintal da sua casa''. Benedetto estourou o joelho na mesma tarde. Sua volta ao Boca deve ocorrer só em junho.

Já há, na Argentina, quem defenda a demissão de Sampaoli. O treinador daqui por diante não vai ter paz. O povo argentino é tradicionalmente rebelde com os deslizes dos poderosos, e Sampaoli é só isso – um poderoso, não alguém admirado.

Em países civilizados, figuras públicas ganham muito mais que ''cem pesos por mês'' também para dar exemplo. Mas Sampaoli está na média de uma sociedade que explode por caprichos inúteis, como não aceitar que um profissional faça aquilo que é obrigatório e que contrarie o seu ''jeitinho argentino''. Muy triste.

''Em outros lugares, neste momento, ele estaria desempregado'', afirma o ótimo editorial desta terça-feira (26) do jornal ''La Nación''.

Trechos:

''Esta frase revela uma visão de mundo inaceitável. Não se deve permiti-la no futebol argentino e muito menos na sociedade argentina. Como o agente não fez o que ele esperava, o técnico da seleção optou por denegri-lo jogando na cara seu poder e sua superioridade econômica. Isso não fala bem dele, um dos homens mais importantes e influentes do país. Poucas coisas denigrem mais o ser humano que humilhar o mais débil.''

''Amante das frases complexas e do excesso de palavras, Sampaoli não precisa de uma coisa e nem outra para recuperar sua imagem. Não lhe resta outra alternativa a não ser um 'errei, peço desculpas' para seguir sonhando com a final de 15 de julho, meta de tantos que ganham cem pesos.''

''Sampaoli demonstra estar distante da sensibilidade social, algo que sempre se preocupou em transmitir, e que sempre lhe gerou a adesão dos políticos. O esportista muitas vezes não quer ser exemplo, mas essencialmente o é. Não é uma pessoa a mais, um anônimo. E a lei cabe ao técnico da seleção de futebol.''

A AFA ainda não se pronunciou sobre a noite de fúria de Sampaoli.

* Atualizado às 14h04: Sampaoli divulgou uma carta pelos canais da AFA ''pedindo perdão pelo mau exemplo'' e dizendo ''que uma pessoa não é aquilo que ela ganha''. O treinador prometeu procurar o policial para dizer o mesmo pessoalmente. Pela manhã, Jorge já havia ligado para a prefeitura de Casilda, no mesmo tom. A carta não diminuiu a fúria dos torcedores nas redes e nas TVs. Eles seguem defendendo sua renúncia e dizendo que vão torcer contra a seleção.

O blog apurou que a AFA não pensa em punir o treinador de nenhuma maneira porque ''o assunto ocorreu em sua vida privada''.