Preconceito por ser vegano: o calvário de um titular do Boca na Argentina
Tales Torraga
O Boca Juniors que enfrenta o Palmeiras hoje (25) às 21h45 (de Brasília) na Bombonera vai contar com a entrada do volante colombiano Sebastián Pérez, que fará sua primeira partida como titular nesta Libertadores. Recuperado de um rompimento dos ligamentos cruzados do joelho esquerdo sofrido há um ano, ele foi notícia frequente até mesmo durante o seu período de afastamento.
A razão?
Pérez é um dos únicos atletas que se dizem veganos em uma Argentina que é a ''terra do churrasco'' e carnívora como poucas outras nações do mundo.
Uma verdadeira elucubração invadiu as discussões sobre o seu futebol e a sua alimentação. Na lógica de muitos torcedores e até de alguns jornalistas, Pérez, afinal, se machucou e demorou tanto para voltar a jogar por ser…vegano.
Basta ver o trecho de uma entrevista sua nesta segunda-feira (23) em Buenos Aires ao apresentador Colorado Liberman, do Fox Sports local.
Pérez saiu-se com essa:
''É um tabu que se tem com este tipo de alimentação na Argentina. Há atletas de alto rendimento que são veganos. Nunca fui de físico grande e sabia que iam começar a falar sobre minha alimentação, porque não é comum no futebol.''
''Se um jogador que come de tudo fica machucado e não pode jogar, ninguém vai dizer nada. Mas ocorre comigo e passam a dizer que eu não jogo porque sou vegano. Já estou preparado mentalmente para isso. Estou em um bom nível e preparado para ocupar este espaço no Boca. É o que importa para mim.''
Sebastián está com 25 anos e chegou ao Boca em dezembro de 2016, depois de se destacar no Atlético Nacional campeão da Libertadores daquele ano e ocupar um espaço cativo na seleção da Colômbia. Sua chegada a Buenos Aires ocorreu com ares de estrela, até pelo look despojado e de fácil semelhança com os argentinos cabeludos dos anos 80 e 90. Sua contratação custou US$ 3 milhões ao Boca.
No mês passado, em entrevista ao ''Clarín'', maior jornal da Argentina, ele contou que sua escolha alimentar é decorrente do seu respeito por todos os seres vivos, e que o novo estilo de vida foi adotado justamente enquanto se recuperava da lesão.
O Boca não vetou a sua escolha, embora tenha feito a ressalva de verificar o que aconteceria com seu corpo durante o período de competição. Na pré-temporada, Pérez emagreceu cinco quilos entre gordura e massa magra. O clube, óbvio, não estabelece nenhuma relação entre a sua inatividade e a sua forma de comer.
Pérez diz que hoje se alimenta de lentilhas, saladas, cogumelos, cereais, arroz e massas – e ingere nozes e amêndoas para somar proteínas.
O difícil é driblar os churrascos no clube, pois os argentinos não vivem sem o seu asado. ''Pego arroz e saladas, ninguém me fala nada, o técnico disse que não se envolveria com a minha escolha em absolutamente nada.''
Segundo levantamento publicado pela revista ''Forbes'' em 2015, a Argentina é o quarto país que mais consome carne bovina no mundo, atrás só de Austrália, Estados Unidos e Israel, os três primeiros nesta exata ordem. O argentino come, em média, 84,69 quilos por ano. O Brasil é o sexto nesta lista (78,11 quilos/ano).