Patadas y Gambetas

Como Tevez deixou de ser o “Jogador do Povo”

Tales Torraga

Cria do Fuerte Apache, favela das mais violentas das Américas, Carlitos Tevez há 15 anos nutre o imaginário da ascensão social por meio do futebol. Virou o ''Jogador do Povo''. E agora não banca viver com seu povo.

Vá entender.


A própria torcida do Boca digeriu mal seu discurso de que precisa ir embora porque é impossível viver na Argentina, de que quando joga mal precisa se esconder debaixo da cama de tão loucos estão os argentinos.

Ele não sabia disso quando saiu da Juventus para voltar ao Boca?

A crítica não passa pelo dinheiro. Ninguém questiona seu direito de trocar Buenos Aires por Xangai para forrar o bolso com R$ 250 milhões por uma temporada. O que machuca é a cascata – em bom espanhol, a sarasa que Carlitos adotou como tom.

Tevez sempre soube que a proposta chinesa era tentadora e que sua ida ao país era questão de tempo. Mas não. Dissimulou e preferiu apontar o dedo para convulsões sociais em vez de reconhecer o óbvio em qualquer lugar, de Núñez ao Fuerte Apache: é impossível dizer não a este montante de dinheiro, como finalmente vai reconhecer nesta quarta na Casa Amarilla, o CT do Boca.

Carlitos preferiu dramatizar. Falar que foi injustiçado (!!) pela patada que acertou e quebrou a canela do volante do Argentinos e o maxilar do goleiro do Newell's em vez de simplesmente dizer: ''Desculpa, gente, é impossível recusar esta proposta''.

Quem não iria entendê-lo?

O resultado da sua nefasta estratégia é latente na capital argentina nesta terça. Há até quem enxergue o assalto à sua casa como uma mera encenação.

Não é a primeira vez que Tevez se envolve em tais suposições – que, embora sejam suposições, revelam como a opinião pública está lendo a sua postura. A conjectura portenha hoje é a mesma dos corintianos dez anos atrás, quando Carlitos comemorou gol mandando a torcida calar a boca, caso tido como pensado para criar confusão e trocar o Parque São Jorge pelo West Ham, o Juventus da Inglaterra.

A fragilidade do discurso carlístico é tamanha que seu entorno já dá como certa a volta ao Boca para a Libertadores de 2018. Esa sí la ganamos, loco, eh?

Se é tão difícil viver e ser feliz na Argentina, por que cruzar o mundo e voltar?