Patadas y Gambetas

Socos, mentiras e pontapés; as (muitas) encrencas do novo técnico do Boca

Tales Torraga

Toda a Argentina vai parar – mesmo – às 17h deste domingo (5) para ver, no Monumental, River Plate x Boca Juniors pela sexta rodada do campeonato nacional.

Famoso em todo o mundo, o ''superclássico'' desta vez já tem personagem antes mesmo de começar: Guillermo Barros Schelotto, técnico do Boca desde quarta.

A torcida do River tira sarro. Diz que a fase do Boca é tão ruim que precisa de dois técnicos – Guillermo e Gustavo, irmão gêmeo e ajudante

Competente atacante e parceiro de Boca de Tevez, Riquelme e Palermo, Schelotto ganhou quatro Libertadores, dois Mundiais, duas Sul-Americanas e duas Recopas.

Mas é reconhecido na Argentina pelas ''avivadas'' – tirar proveito e o rival do sério.

Sua mais célebre briga foi na Bombonera – Boca x River da semifinal da Libertadores 2004. Na confusão em que Gallardo, hoje técnico do River, arranhou o goleiro Abbondanzieri, Schelotto deu um soco em Gabriel Macaya, preparador físico.

Macaya ficou caído no chão por minutos. Schelotto, de 1,71 metro, seguiu no jogo. E foi decisivo no histórico confronto de volta.

Famoso no Brasil por Tevez imitar uma galinha, aquele River x Boca na Argentina é mais recordado pelo teatro de Schelotto.

''Esse senhor, que não sei como se chama, está me xingando'', foi a frase de Guillermo que desatou a ira de Hernan Díaz, assistente-técnico e ex-astro do River. Díaz foi expulso e deixou o gramado jurando pegar Schelotto.

Instantes depois, o diálogo mais famoso do futebol argentino moderno.

– Idiota, te expulsaram, disse Schelotto a Sambueza, de 20 anos
– Quê?
– Te expulsaram, tonto

Enganado, o meio-campista do River reclamou com o juiz, Héctor Baldassi. Protestou tanto que – sim! – Sambueza acabou enfim expulso.

Nos pênaltis, o Boca eliminou o River.

''Fizeram bagunça nos dois jogos. Não têm raça para jogar a final, como a gente'', comemorou Schelotto sem mencionar a sua própria bagunça.

A revista El Gráfico mostrava desde 1997: Schelotto manejava tão bem situações difíceis que ''fumava embaixo d'água''.

Como no bate-boca com Francescoli, ídolo do River. Jogando pelo Gimnasia de La Plata, disparou: ''Como você é bonzinho, por que não compra uma roupa de padre?'', e Enzo respondeu: ''Cale a boca, moleque, tenho dois milhões no banco''.

''E ainda assim você não arruma essa cara de sapo?'', foi a resposta de Guillermo.

Schelotto e Francescoli

Se falasse a Simeone ou Ruggeri, pararia no hospital.

Como quase parou em 1997. No Boca x Independiente, levou cotovelada que rasgou seu rosto. À noite, na TV, reclamou do lance. A emissora em seguida pôs ao vivo o defensor Arzura, que disparou: ''Não tive má intenção, mas para um jogador com Guillermo isso seria bom. Ele fala demais e precisa aprender algumas coisas''.

Maradona e Guillermo em 1997

Em outra ocasião, encontrando o chileno Marcelo Salas em campo, disparou: ''Marcelito, é você? Como está gordo!''.

Em um Boca x Chacarita, levou entrada forte e reclamou com o árbitro:

– É para cartão! Amarelo, juiz!
– Não, não para tanto
– Claro que sim!
– Por quê?
– Olhe a cara dele. Que feio. Merece um amarelo pela feiúra.


Adorava fazer gols e criar confusão com o River. ''Guillermo, o Boca jamais vai te esquecer. O River muito menos'', é uma das bandeiras da torcida.


Riverdugo, seu apelido – verdugo, carrasco em espanhol.

Em 2005, Boca 2×1 River, Guillermo, substituído, estava no banco. O técnico Astrada reclamou a demora dos gandulas. Schelotto não pensou duas vezes: ''As bolas? Vai buscá-las no gol do Costanzo''.

Com Tevez, colega de ataque e de confusões com o River, costuma ser cordial. Mas já em seu primeiro treino o chamou para impor limites, como recolher sempre as garrafas da água que toma no treino.

Com Gallardo, técnico do River deste domingo, a situação é mais tensa.

Embates entre os dois vêm desde os anos 90, como mostra a capa da El Gráfico. Guillermo e Gallardo estão na ponta cruzando o olhar.


E em algum momento se cruzaram também nas patadas desferidas por Guillermo.

Os dois se encontraram nos Estados Unidos em 2008. Gallardo, pelo DC United. Guillermo, pelo Columbus.

De tantas histórias, Guillermo tem três livros contando sua vida. E aos 42 anos. Particularidade argentina. Bom tema logo rende livro. Não há a espera por conquista, aposentadoria ou data específica para lançar uma obra.

O primeiro livro de Schelotto foi – vejam o nome – 'Guillermo, o terrível', do diário ''Olé'' em 2006, quando tinha 32 anos e seguia jogando.

Em 2010, publicou seu livro infantil, 'As aventuras do gêmeo'.


No ano seguinte, foi tema do CQC argentino como ''o maior mentiroso do futebol''. Em um ano, lança livro infantil. No outro, é chamado assim. Loucuras argentinas.

Em 2014, já técnico, foi tema de Dribles e Caprichos, de Marcelo Lipovetsky.

Quem também tem histórias com Schelotto é o Palmeiras. Em 2000, foi ele o cobrador da primeira penalidade na decisão da Libertadores no Morumbi. Na Argentina, até hoje Guillermo é lembrado pelo ''primeiro pênalti do primeiro título''. No ponto e aqui, com os históricos comentários de Maradona no canal PSN:

Outra polêmica de Schelotto, palavrões com um cinegrafista em pleno jogo.

Como técnico, discutiu com dirigentes e fez Patón Bauza, hoje no São Paulo, dizer: ''Gosto dele. Mas enche o saco''.

O picante clássico de amanhã já está com muitos pratos na mesa. Resta saber se vai prevalecer a ''picardia'' de Schelotto…

…ou se ele vai se controlar e lembrar que um dia esteve próximo e feliz com seu ex-companheiro de seleção de base Marcelo Gallardo.