Patadas y Gambetas

‘Os maus têm de estar no futebol’, diz jogador que quebrava todos pelo Boca

Tales Torraga

Boca Juniors e Racing fazem às 19h30 desta quinta (3) o clássico argentino da fase de grupos da Libertadores. O jogo será na Bombonera e sem público, punição por agredir o River Plate ano passado.

A falta de torcida não vai interferir em nada no jeito argentino de se jogar. Duro e com a ''perna forte'', principalmente na Libertadores, obsessão dos clubes do país.

Serna levanta Saviola. Crédito: Olé!

Tratada pela torcida com a relevância destinada a gols e dribles, a intensidade empregada por certos jogadores beira a deslealdade. Quem narra episódios de verdadeira loucura é o colombiano Chicho Serna, histórico volante do Boca.

''Os maus têm de estar no futebol'', é a sua defesa para as táticas espúrias.

Seu sincericídio narra também o que fazia para lesionar adversários –  perguntar a jornalistas onde de fato era o machucado para bater no ponto exato.

Serna e Aimar longe da bola. Crédito: Olé!

A apuração de Serna era a maneira de não cair em outra artimanha muito usada no futebol argentino – enfaixar uma parte do corpo que está boa justamente para enganar o adversário e não mostrar onde está o machucado.

Serna assume que usar a violência, no fundo, era admitir inferioridade: ''Era muito difícil competir contra jogadores como Aimar. Se não fosse assim, não tinha jeito''.

As táticas incluíam intimidar os adversários desde antes do jogo. ''Hernán Díaz, do River, me dizia: 'Chicho, olha o que tenho para você', e me mostrava as travas. 'Tranquilo, Hernán, as minhas são o dobro''', respondia.

A dissimulação de Serna incluía também avisar o juiz quem ele iria pegar. ''Era uma decisão minha, não uma ordem do banco. Antes de começar o jogo, ao cumprimentar o árbitro, dizia: 'Se prepare que na primeira vou cruzar com este, eh'. Só um, Angel Sánchez, me falou algo: 'Se não tiver cuidado, te expulso'''.

As brigas não ficavam em campo. Com Trotta, defensor de Vélez, River e Racing, quase saiu na mão ao deixar uma boate. Precisou ser contido pela mulher. ''A partir daí, cada vez que jogávamos era pior.''

E foi dessa maneira que aquele Boca entrou para a história com três Libertadores e dois Mundiais em somente quatro anos. Com os gols de Tevez, Palermo e Riquelme. E com as patadas de Serna, Bermúdez e tantos outros.

A grande maioria da torcida do Boca declara com naturalidade a atração por defensores ''feios, sujos e maus''.

O restante da Argentina tira sarro. Diz que a torcida do Boca não vai à Bombonera – e sim a uma granja, de tanto que a torcida quer huevos, raça, colhões.

Os grandes de São Paulo sofreram nas mãos e nas patas daquele Boca.

Trio colombiano com a Libertadores 2000 no Morumbi

Na Mercosul de 1999, o São Paulo levou 5×1 na Bombonera. No mesmo torneio, no ano seguinte, o Corinthians caiu por 3×0 também em Buenos Aires.

O Palmeiras perdeu a Libertadores de 2000 em pleno Morumbi e foi eliminado na semifinal de 2001 no Parque Antarctica, ambas as vezes nos pênaltis.

O Santos em 2003 também viu o Boca festejar em São Paulo. Depois de perder por 2×0 na Bombonera, caiu por 3×1 no Morumbi.

Maior técnico do Boca, Carlos Bianchi foi filmado mandando seus atletas serem mais bruscos contra o Racing. A ordem é clara: ''Metam-lhe (a perna)! São firuleiros''.

A imagem que jogadores de Colômbia, Paraguai e Argentina tem de atletas do Brasil é bem explicada por Chilavert. Ao ilustrar uma discussão com Paulo César Carpegiani, técnico da seleção paraguaia, soltou a frase comum de se ouvir em estádios da América do Sul: ''Os brasileiros encolhem sempre''.

A Libertadores 2001 foi especial neste triângulo sórdido Serna-patadas-brasileiros.

No fim do primeiro tempo, em uma mesma jogada, o zagueiro do Palmeiras Alexandre conseguiu dar uma voadora na canela de Traverso, um pisão na cabeça de Serna e levar o cartão vermelho direto. Bem aqui:

O que pouquíssima gente no Brasil lembra é que aquele Boca jogou em São Paulo há 15 anos em meio a uma séria crise financeira com seu mandatário Mauricio Macri, hoje presidente da Argentina.

Boca comemora em pleno Parque Antarctica

Depois de eliminar o Palmeiras, a TV entrou no vestiário e mostrou a festa dos jogadores. Com camisetas pintadas ''Paguem e calem-se. Salvestrini (tesoreiro), vá ao psicólogo'' e aos gritos de ''Dedicamos a todos os filhos da p… da comissão''.

Juízes, dirigentes e adversários. Um Boca pronto para mastigar qualquer um.

Bermúdez, Córdoba e Serna. Sorriso só para fotos