Patadas y Gambetas

Até que a pimenta nos separe. O fim da amizade dos técnicos de Boca e River

Tales Torraga

Apontado na Argentina como favorito à taça, o Boca de Tevez, Lodeiro e Osvaldo estreia hoje na Libertadores às 21h45 contra o Deportivo Cali, na Colômbia.

Será a volta do clube à competição depois da nefasta noite do gás.

Temendo a segunda derrota seguida para o River – caíra na Sul-Americana -, um torcedor do Boca queimou, com spray de pimenta, os olhos de seis adversários.

A insanidade tirou a equipe da Copa. E pôs fim à amizade de 25 anos entre Rodolfo El Vasco Arruabarrena e Marcelo El Muñeco Gallardo, técnicos de Boca e River.

Gallardo no instante em que deixava a Bombonera – e também de ser amigo de Arruabarrena

O rompimento partiu de Gallardo. Por quatro motivos:

1) Mesmo com seis jogadores do River sem condições – Ponzio, Driussi, Martínez, Vangioni, Kranevitter e Funes Mori -, o Boca insistiu jogar.

2) Suspendida a partida, ficaram perfilados em campo, como se fosse recomeçar.

3) Com poucos médicos e sem água no gramado, não ajudaram – por duas horas e quinze – o River a enfrentar as garrafadas da torcida e voltar ao vestiário. 

4) Ao sair de campo, aplaudiram os agressores.

O descontrole de Arruabarrena nove meses atrás foi notado também na tentativa de agredir o presidente do River, Rodolfo D´Onofrio.

Ao ouvir o técnico questionar sua presença no gramado, o presidente respondeu e desatou a ira do treinador:

''Estou aqui para falar com os donos do circo. Não com os macacos''.

El Vasco tira o casaco para bater em D´Onofrio, presidente do River

Arruabarrena ligou para Gallardo – sem resposta. O técnico do River desde então o trata com frieza e distância. Sem papo. Só protocolo.

Cegos de raiva e frustração naquela noite, Gallardo e Arruabarrena pouco levaram em conta os jovens amigos cheios de sonhos que foram.

Os dois – Muñeco com 15, Vasco com 16 – jogaram juntos o Mundial Sub-17 na Itália em 1991. Saíram terceiros. Dividiam até o transporte.

Gallardo e Arruabarrena, companheiros de seleção e caronas em 1991

Era o pai de Arruabarrena quem dava, depois do treino, carona a Gallardo até a estação de trem.

A partir dali, muito em comum.

Gallardo, espetacular meia, virou símbolo do River nos anos 90. Arruabarrena, lateral-esquerdo, um inegável referente do Boca.

Arruabarrena e Gallardo na temporada 1996-1997

Entre 1999 e 2000, foram para a Europa. Muñeco (pela aparência de boneco), para o Monaco. El Vasco (origem basca), para o Villarreal.

Pararam de jogar com camisas distantes das do início. Gallardo deu seus últimos passes no Nacional (Uruguai). Arruabarrena, na Universidad Católica (Chile).

Em 2010, voltaram ao convívio da juventude. Estudaram na mesma turma da Escola de Técnicos Vicente López, em Olivos, cidade-quase bairro da capital Buenos Aires.

''A escola abria às 19h30 e o Vasco chegava às 19h'', disse o diretor Luis Lescurieux ao jornal ''La Nación''. ''Ele se vestiu até de ajudante para participar. Muito responsável e disposto para a parte prática. Um aluno incomum.''

''Marcelo era mais quieto, mais calmo, mas quando falava era muito claro. Ele e Arruabarrena se respeitavam e tratavam na boa a rivalidade entre Boca e River.''

As coincidências continuaram. Gallardo assumiu o River com a saída de Ramón Díaz, técnico mais vitorioso do clube. Arruabarrena foi o escolhido como treinador xeneize para o lugar de Carlos Bianchi, poderoso emblema de conquistas.

Esposa de Gallardo, Alejandra é, da infância até hoje, simpatizante do Boca. Marisa, mulher do Vasco, torce para o River.

Arruabarrena conforta Gallardo pela morte da mãe em 2014

Que daí surja a reaproximação. Exemplos de tantas coisas boas e de vidas tão cruzadas, Gallardo e Arruabarrena têm valiosa oportunidade.

A de mostrar que a amizade sempre pode recomeçar.

Tiempo al tiempo, muchachos.

Cuando niño preguntaba
Si el río llegaría algún día al mar
Una voz que andaba por ahí
Me dijo: “tiempo al tiempo”

La verdad es que ya aprendí a esperar
Que se escriba sola la canción
Cada cosa en su justo lugar
Dale tiempo al tiempo

Nace una flor un día
Y a la misma hora muere un amor
Es dura la caída
Pero qué alegría cuando hacemos el gol

Cada día es una oportunidad
De salir a la calle y enfrentar al viento
Los sueños a veces se hacen realidad
Dale tiempo al tiempo

Pensaba en Los Decadentes
Cuántas noches en la ruta
Hoy siguen juntos, qué bueno que está
Dale tiempo al tiempo

A las ruinas del amor
El cadáver de tu enemigo
Te acerca la distancia
Entonces, estás vivo

Cuidado con lo que quieres
Porque algún día lo podés conseguir
No se trata sólo de tu voluntad
Dale tiempo al tiempo

Todos los días sale el Sol
Y la Luna vuelve a brillar
Ni siquiera una bomba lo puede parar
Dale tiempo al tiempo
Tiempo al tiempo

Espero que los tuyos estén bien
Y vivas con felicidad
Lo que te queda en este mundo
Nadie sabe más allá

Dale tiempo al tiempo…