Patadas y Gambetas

‘Passarella assume que errou com meu cabelo’, diz Caniggia

Tales Torraga

Aconteceu há exatos 20 anos, então muitos dos brasileiros mais novos nem conhecem a história – e devem custar a acreditar que é verdade. Na preparação para a Copa do Mundo de 1998, o então técnico da Argentina, Daniel Alberto Passarella, simplesmente exigiu que a sua equipe cortasse o cabelo e ignorasse a então tradição de se portar cabeleiras. Era um resquício da rebeldia frente aos militares e da maneira de se viver de acordo com o rock, tão popular no país.

Passarella bateu de frente com três cabeludos de então: o volante Fernando Redondo e os atacantes Gabriel Batistuta e Claudio Caniggia. E com os três vivendo o auge de suas carreiras. Redondo foi o primeiro a pular fora: defenestrou Passarella, o chamou de mentiroso e se recusou a ir para a Copa.

Batistuta topou seguir o rigor marcial do Kaiser e aparou as madeixas. Caniggia teve uma negociação muito mais longa e complicada com Passarella – no fim das contas, por conta do desgaste e por querer provar ao técnico que estava errado, acabou se machucando, não podendo defender a Argentina naquele Mundial.

O assunto voltou a ganhar força em Buenos Aires nesta quarta (16) com a reveladora entrevista de Caniggia ao Fox Sports, esta aqui.

Caniggia bateu forte em Passarella – e colocou um ingrediente novo nos relatos a respeito. Com ambos cara a cara, o ex-técnico reconheceu que errou a mão naquele episódio. Os principais trechos da entrevista do eterno Pájaro Caniggia:

''Passarella me escalou nas Eliminatórias, mas sempre me falando do cabelo. E eu lhe perguntava: você está falando isso de verdade ou de brincadeira? Me parece uma situação ridícula, que importa o cabelo?''

''A dez dias da convocação para a Copa, ele me telefona e a gente começa a discutir. 'Tudo bem, Daniel, corto um centímetro, um centímetro e meio', e ele me respondia 'Não, precisa ser mais, três ou quatro'. Eu não acreditava que ele estava me falando aquela estupidez.''

''Eu vinha de uma lesão, mas estava treinando bem, tanto estava bem que acabei convocado até para a Copa seguinte, a de 2002.''

''Ele quis limpar [tirar] a mim, a Batistuta e Redondo. A verdade é essa. Redondo foi forte, a entrevista dele foi histórica. Mas até com o Batistuta ele se meteu.''

''Disse na cara dele quando Passarella era presidente do River: 'Você me cagou uma Copa. E isso é difícil de aceitar'. E ele me respondeu: 'Já foi, já passou, eu errei, vamos esquecer tudo isso'. Respondi dizendo que a explicação dele não tinha sentido, que não dava para fazer isso com um jogador, foi muito duro assimilar.''

Passarella jamais tocou no assunto publicamente. Hoje com 64 anos, ele vive recluso na Argentina desde que deixou a presidência do River, em 2013, acusado de crimes como faturar na revenda de ingressos para a barra brava.

Mesmo sem Redondo e Caniggia, a Argentina avançou até as quartas da Copa de 1998 e foi eliminada pela Holanda, com gol de Bergkamp no último minuto. Batendo a Laranja, a Argentina de Passarella faria a semifinal contra o Brasil de Zagallo.