O dia em que Waldir Peres quase perdeu a orelha na Argentina
Tales Torraga
Grande goleiro, Waldir Peres foi também a prova viva do quanto os brasileiros sofriam para enfrentar os times argentinos na Libertadores.
Em uma das ocasiões em que esteve em Buenos Aires, Waldir Peres quase ''ficou sem orelha'', como nos contou certa vez, chorando de rir.
O jogo que Waldir sempre detalhava aos chegados era a final de 1974, quando o São Paulo visitou o Independiente, então quatro vezes campeão da América. O Rojo era o bicampeão vigente, ganhador da Copa em 1972 e 1973.
O São Paulo venceu de virada a primeira partida daquela final – 2×1 no Pacaembu, gols de Pedro Rocha e Mirandinha para o Tricolor (e de Saggioratto para o Rojo).
A segunda partida foi na casa do Independiente, a Doble Visera, em Avellaneda, com 55.000 fanáticos, borrachos y locos superlotando os espaços.
Logo aos 9 minutos, Waldir tomou a pedrada que abriu sua cabeça e exigiu a ida ao vestiário para costurar e enfaixar a cabeça. Tomaria mais uma, no segundo tempo, de um pedaço de concreto, perto da orelha, agressão que Waldir sempre repetia – com ar moleque e certa dose de exagero – quando lhe perguntavam sobre as intimidações sofridas naquele tempo. ''Bolinha de gude, pau, cimento, os argentinos jogaram de tudo em mim. Não tinha punição, o juiz não parava o jogo, só tinha expulsão quando praticamente matavam um'', contava o ex-goleiro.
Waldir repetia sempre que levara outras pedradas, mas as paralisações do árbitro uruguaio Ramón Barreto foram duas – foi esta também a quantidade que publicou a ''Folha de S.Paulo'' no dia seguinte à final.
Aproveitando que o São Paulo não contava com seu goleiro 100%, o Independiente ganhou em Buenos Aires por 2×0, gols de Bochini e Balbuena.
Waldir embarcou para o jogo-desempate de Santiago com a cabeça ainda enfaixada, como mostra a histórica foto do ''Jornal da Tarde''.
Três dias depois, não teve pedrada e não teve torcida selvagem. Em campo neutro e contando com um verdadeiro timaço, o Independiente venceu o São Paulo por 1×0 no Estádio Nacional – gol de Pavoni -, conquistando o penta.
A soberania argentina na Libertadores neste tempo era a maior da história.
Em 1974, suas conquistas eram nove (cinco com o Independiente, três com o Estudiantes e uma com o Racing), contra quatro do Uruguai (três do Peñarol e uma do Nacional) e duas do Brasil, ambas com o Santos de Pelé, em 1962 e 1963. O país voltou a ganhar a competição em 1976, com o Cruzeiro de Palhinha e Raul.