Patadas y Gambetas

Por que a droga e o doping rondam a Argentina bem antes do “caso Lavezzi”

Tales Torraga

“Ninguém tem moral para me falar nada sobre droga. Se vamos falar de droga, precisamos voltar a um processo muito largo e muito velho no futebol argentino, um processo de quando eu ainda não jogava, da Libertadores que nunca joguei.''

“Daniel Passarella: se eu conheci a droga no futebol, foi por você.''

O trecho é da autobiografia de Diego Maradona, 'Yo soy el Diego de la gente', e escancara: o esporte argentino lida com as drogas há muchas décadas.

O ''caso Lavezzi'' detonado na noite passada é um desdobramento desta sina que expõe a realidade da Argentina que lidera o consumo regional de álcool, tabaco e demais drogas – não seria diferente neste simulacro da vida chamado esporte.

(Diferente como? Muitos cantos de torcida falam de crack, maconha e cocaína.)

Faz sentido que a linha do tempo (e da droga) aponte como ponto de partida o Mundial de 1978. Esta Copa foi marcada pela grave desconfiança das outras seleções com o doping argentino. Foi Ortiz, atacante titular daquela Argentina, quem confirmou: sim, houve droga e suborno naquela campanha.

Aquela Seleção tinha também dois jogadores que sofreram muito com as drogas no pós-carreira: o primeiro, o lateral Alberto Tarantinicom a cocaína. Outro, René Housemann, que anos depois declarou que precisava beber até para jogar.

Abalados pela Guerra das Malvinas, a Argentina de 1982 passou longe de questões narcóticas, mas aquele Mundial marcou o início da pesada dupla que seria desfeita em 1986, a de Maradona e Passarella. Passarella acusou Maradona de se drogar na preparação para a Copa do México – Diego jura: no pasó nada.

O auge das drogas na Argentina veio em 1990. Primeiro, com o famoso caso da ''água batizada'' dada ao lateral brasileiro Branco. Depois, com jogadores que sofreram com as mais diversas substâncias, casos de Caniggia, Maradona, Monzón e Batista. Nenhum deles jamais admitiu consumo durante o Mundial da Itália.

Algo que sempre intrigou a Argentina: por que tantos drogados se esta Seleção tinha um renomado médico no comando, Carlos Salvador El Narigón Bilardo?

Talvez porque Bilardo também tenha recorrido às drogas nos tempos de jogador, como falou Maradona depois de romper sua parceria com ele em 2010.

No Mundial dos EUA-1994, na reedição do duo Caniggia-Maradona, veio o caso da efedrina de Diego que expulsou Maradona da Copa depois de só dois jogos.

(Falou-se muito tempo na Argentina que Maradona era tão amigo assim de Caniggia porque era Cani quem fornecia sua droga, algo sempre negado pelos dois.)

Na repescagem daquelas Eliminatórias, Maradona já afirmara que não houve antidoping e que Julio Grondona, presidente da AFA, havia mandado o time tomar um ''café veloz'' para vencer a inofensiva Austrália e não ficar fora do Mundial.

Na Copa de 1998, a imprensa noticiou que Verón testara positivo para cocaína, mas a informação não se confirmou e o volante jogou normalmente aquele Mundial.

O episódio iniciou também a greve (e a guerra) de silêncio contra a imprensa, algo reeditado 18 anos depois, agora com Lionel Messi e Ezequiel Lavezzi.

Naquele time, e no Mundial de 2002, uma das estrelas era Ariel Ortega, de admitidas dificuldades com a bebida, algo que até hoje aflige a Argentina – em seus tempos, foi um caso muito parecido com o de Adriano Imperador no Brasil.

Houve um período de trégua nesta triste e delicada questão – foi no Mundial de 2006 na Alemanha, quando a Argentina era treinada pelo ''paizão'' José Pekerman.

Nesses tempos, o esporte que dava o que falar a respeito do consumo de drogas era o tênis. A ''Legião'', como é conhecida esta camada de tenistas na Argentina, foi flagrada no doping entre 2000 e 2005 com Guillermo Coria (nandrolona), Juan Ignacio Chela (metiltestosterona), Mariano Puerta (efedrina), Guillermo Cañas (diurético), Martín Rodríguez (cafeína) e Mariano Wood (finasteride). Cosa de locos.

Veio depois o Mundial de 2010.

Treinada por Maradona, a Argentina causou polêmica ao incluir na relação para a Copa o zagueiro Ariel El Chino Garcé, que havia testado positivo para cocaína.

Em 2014, o antecipo das polêmicas detonadas na já famosa noite desta terça.

Na prévia para o Mundial, houve suspeita e posterior informação de que Ever Banega e Ezequiel Lavezzi haviam então fumado maconha. Banega foi afastado. Lavezzi integrou a Argentina que só parou na Alemanha e na final.